De acordo com o relatório de auditoria do Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro (TCE-RJ), o Maracanã foi superfaturado. O documento aponta uma série de itens sem justificativa técnica ou suprimidos e substituídos com valor superior em um “jogo de planilha”, somando R$ 67,3 milhões. O texto pede o cancelamento do pagamento desses valores às construtoras Odebrecht e Andrade Gutierrez. A reforma do estádio, orçada em R$ 705 milhões, tem custo final estimado em R$ 1,2 bilhão. O GloboEsporte.com teve acesso ao relatório que ainda está sob análise dos conselheiros do TCE-RJ, de acordo com a coluna “Radar”, da Revista Veja, que divulgou o superfaturamento no último dia 12.
O documento ordena a notificação de diretores de órgãos públicos envolvidos na fiscalização e execução da reforma, como a Secretaria de Estado de Obras (Seobras), e a Emop (Empresa de Obras Públicas do Estado do Rio de Janeiro), enumerando questões que vão de controle deficiente a emissão de ordem de serviço sem aparo do projeto executivo. Hudson Braga, Secretário de Obras do Estado do Rio de Janeiro, é notificado para que seja feita, além de correções e possíveis reposições de corrimãos tubulares, uma adequação em função da instalação de grades não previstas no projeto inicial e correção de assentos instalados sem controle e “resistência mínima” para uso. Grades e assentos
As divisórias para torcidas instaladas após a Copa das Confederações provocam pontos de visão obstruída na arquibancada, o que não é permitido pelo caderno de encargos da Fifa, ao qual o Maracanã supostamente deveria se adequar com a reforma bilionária. As orientações do TCE-RJ para Braga em relação às grades são melhoria do ângulo de visão para os espectadores em áreas contíguas às grades; eliminação de áreas não utilizáveis contíguas às grades; eliminação da “interface com os guarda-corpos de vidro que acarretam condição insegura aos usuários”; solução para a perda de função dos corrimãos devido à proximidade da grade; remoção dos parafusos remanescentes da retirada de assentos para instalação das grades, representando risco aos usuários.
Os demais itens das notificações ao secretário incluem ainda, além da retenção de pagamento, reparar muretas com rachaduras em frente ao acesso ao setor VIP do estádio; revisar as distâncias laterais entre assentos e corrigir o posicionamento dos que estão fora do padrão “demonstrando não ter havido controle na instalação das peças”; e revisar o sistema de fixação dos assentos “cuja instalação foi executada em desacordo com o projeto, conforme relatado no Relatório de Auditoria anterior (…) que evidencia não apresentar resistência mínima compatível com o uso”.
Jogo de planilha
É ressaltado que novamente se verificam deficiências já constatadas em duas auditorias anteriores: “os projetos executivos continuam a ser desenvolvidos com expressas modificações na medida em que os serviços são realizados. Constatam-se diversas incompatibilidades entre os serviços em execução e os projetos disponibilizados, além disso, os projetos, frequentemente, apresentam-se desatualizados ou incompletos, impossibilitando a avaliação da obra como materialização do que fora projetado”.
Trecho extraído da folha 763 do relatório de auditoria fala em artimanhas para promover alterações no projeto: “supressão de vários itens, sob a justificativa de não ter sido necessária a utilização daqueles serviços existentes na planilha orçamentária, bem como o ressurgimento de itens de serviço anteriormente suprimidos, com valores superiores àqueles licitados, evidenciando o moderno jogo de planilha”. Na folha seguinte, são enumerados argumentos qualificados como “evasivos” para tais alterações, como “recorrentes e recentes determinações da Fifa” e “sobreposição de atividades devido à nova dinâmica da obra”.
Inspeções e serviços inacabados
Ao discorrer sobre a situação física da obra, o texto cita inspeções “in loco” nos dias 9, 12, 16, 18 e 23 de julho de 2013. Mesmo depois da Copa das Confederações, a conclusão das inspeções foi de que, apesar do prazo de conclusão da obra ter sido para 25 de março de 2013, portanto antes da competição, constatou-se que “serviços ainda estavam em execução, diversos deles apresentavam defeitos e outros inacabados”. Mais à frente, o texto ainda afirma que os serviços pendentes ou inacabados “permaneciam sem qualquer ação corretiva, constituindo risco à segurança dos usuários”. No caderno de encargos da Fifa para a construção de estádios, a segurança dos usuários é frisada como prioridade máxima sob todos os aspectos.
Pagamentos indevidos
O item seguinte do relatório trata dos “pagamentos indevidos”: “somente nesta auditoria foi medido e pago indevidamente um valor inicialmente apurado e sem correção de R$ 67.312.986,89”. Segue então uma lista dos valores apurados:
– Limpeza por hidrojateamento 10.000 psi.: R$ 2.160.894,97 – Hidrojateamento abrasivo: R$ 8.178.066,79 – Limpeza por hidrojateamento 6.000 psi.: R$ 1.463.836,20 – Saturação SSS: R$ 8.953.713,63 – Revestimento com argamassa polimérica 5mm: R$ 9.542.776,03 – “Reforço” c/PRFC das arquibancadas Norte e Sul: R$ 20.370.748,55 – “Reforço” c/PRFC das plataformas 2, 4 e 6 das rampas 1 e 4: R$ 7.310.980,95 – Estruturas metálicas das arquibancadas: R$ 513.783,75 – Revestimentos de alto desempenho (RAD): R$ 8.818.186,02
O relatório de auditoria fala em “encerramento do contrato 101/2010” – acordo para projeto e execução da reforma do estádio – e avisa que será sugerido ao Secretário de Fazenda a retenção de créditos das empresas constituintes do Consórcio Maracanã Rio 2014.
Materiais incompatíveis
Outro trecho do documento aborda ainda a “utilização de materiais incompatíveis”. Cita que um determinado tipo de piso foi detalhado para áreas de circulação, de serviço, técnicas e sanitários, a um custo unitário de R$ 38,28, que depois foi suprimido. “O Projeto Executivo definiu novos itens de serviço para essas áreas substituindo o sistema de pisos monolíticos minerais por piso monolítico polimérico”, constando duas propostas comerciais: Na primeira, o custo seria de R$ 115,60 por metro quadrado e, na outra proposta, o valor seria de R$ 231,24. O documento diz que foi adotada a segunda alternativa com argumento “não aplicável tecnicamente”.
G1