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RETIRADA RAZOÁVEL : Jornal diz que a Paraíba perde anualmente R$ 600 mi para a corrupção

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A corrupção retira dos cofres públicos da Paraíba, aproximadamente R$ 600 milhões por ano, o que equivale a 2,3% do Produto Interno Bruto (PIB) do Estado.         O cálculo é feito com base no estudo de percepção da corrupção, do Departamento de Competitividade e Tecnologia (Decomtec), da Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp), que é utilizado como parâmetro pelo Fórum Paraibano de Combate à Corrupção (Focco). No Estado, os números da corrupção superam os do tráfico de drogas, segundo relatório da Polícia Federal. Somente este ano, a PF já contabiliza 437 inquéritos em andamento que investigam os crimes, dos quais 176 foram instaurados de janeiro a setembro, enquanto que o tráfico de entorpecentes, no mesmo período, só teve 23 procedimentos instaurados. O montante desviado por ano no Estado seria suficiente para construir pelo menos 15 mil casas populares, no valor de R$ 40 mil, cada uma. Também poderiam ser construídas 395 creches ou 451 escolas-padrão. Para reduzir os efeitos da seca, seria possível contratar 85.714 carros-pipa, cada um no valor de R$ 7 mil.
De tudo o que a corrupção retira da sociedade, menos de 5% é ressarcido, segundo o desembargador do Tribunal de Justiça da Paraíba e coordenador do Mutirão Meta 18, Aloízio Bezerra. A população é quem paga o preço, sendo obrigada a conviver com problemas, como educação de má qualidade, saúde precária e aumento da miserabilidade, presentes em muitos municípios do Estado.  

“Quando ocupam os cargos, os gestores geralmente declaram que não possuem bens e depois investem os recursos públicos em negócios que são colocados em nomes de terceiros, para que não sejam descobertos. Por conta disso, é difícil identificar para onde os recursos foram desviados. O enriquecimento ilícito do gestor demonstra que ele está usando o dinheiro público e, quando condenados, muito pouco acaba sendo ressarcido. Estimamos que de tudo que é desviado, só volta aos cofres públicos algo em torno de 3% a 5%, o que não representa quase nada diante do que é roubado”, explicou o juiz.

Conforme o procurador-chefe da Advocacia Geral da União (AGU) na Paraíba, Fabio Leite de Farias Brito, de dezembro de 2012 a novembro deste ano, foram ajuizadas pelo órgão, 66 ações, que resultaram em débito de pouco mais de R$ 3 milhões.

Mesmo assim, os acusados ainda não executaram os pagamentos. Segundo o procurador, além de desviarem os recursos, quando são cobrados os valores para ressarcimento, os responsáveis ainda atrasam. “Há uma dificuldade muito grande por parte dos devedores em saldar as dívidas, porque é difícil por conta da ausência de patrimônio. Eles maquiam o patrimônio, colocam os bens em nome de terceiros. Mas o Estado em busca de combater a má gestão. Os órgãos que atuam na fiscalização e no combate têm trabalhado e alcançado bons resultados”, frisou o procurador Fábio Leite.

O chefe da Controladoria Geral da União (CGU), Fábio da Silva Araújo, afirma que desde que o Programa de Fiscalização através de sorteios foi criado, em 2003, já foram auditados recursos na ordem de R$ 667 milhões em 83 municípios, alvos de denúncias de má administração do dinheiro público. Ele ressalta que as áreas de saúde, educação e infraestrutura são as mais afetadas pela corrupção, por conta dos recursos que são maiores.

“A corrupção é praticamente inquantificável. É uma situação complexa, que torna o trabalho de fiscalização dificultoso. É uma área sensível. Existem pessoas que desviam muito dinheiro, e o que temos feito é intensificar as fiscalizações, não somente através dos sorteios, mas também as denúncias que chegam”, destacou.

PF: mais corruptos do que traficantes

Se os órgãos de fiscalização e combate à corrupção sentem dificuldades para combater o crime, a Polícia Federal também encara o desafio de descobrir e indiciar gestores corruptos. “Porque se tratam de crimes envolvendo pessoas que são responsáveis por receber e aplicar os recursos públicos. É difícil para a polícia identificar a corrupção, mas as investigações têm avançado muito. Atualmente, a maioria dos inquéritos instaurados e em andamento são, em maioria, por crime de corrupção. É ainda maior do que o número de inquérito por tráfico de drogas”, disse o superintendente  da PF na Paraíba, delegado Nivaldo Farias de Almeida. 

Para o fundador e secretário-geral da Associação Contas Abertas, Gil Castello Branco, os gestores corruptos buscam alternativas para driblar a fiscalização para que não sejam descobertos e uma das mais comuns é o descumprimento da Lei de Acesso à Informação e Transparência, que determina que cada órgão gestor, disponibilize um portal de informações, com os dados necessários sobre recursos recebidos e os investimentos que são feitos. 

Um levantamento do Focco apontou que até abril deste ano, apenas 49 dos 223 municípios já haviam criado um portal. “Tem que ter o portal e não apenas um site com informações da vida do gestor e informações que beneficiem a ele. Muitos municípios no país descumprem a lei e não disponibilizam os portais. Em outros, há o portal, mas a qualidade não é boa. Muitos gestores alegam que não têm recursos. Na verdade, não há um interesse, para que a sociedade não tenha conhecimento, para cobrar e fiscalizar”, contou Gil.

Rombo em Caldas Brandão 

Caldas Brandão, no Agreste, amarga as consequências da corrupção. Em 2012, a fiscalização da CGU constatou problemas em todas as áreas da gestão municipal. Na Ação Social, famílias carentes não tinham acesso ao Bolsa Família, mas funcionários municipais e de empresas privadas de João Pessoa recebiam o benefício. Na educação, o órgão identificou que recursos do Fundeb eram desviados para outras finalidades e a merenda escolar não chegava às escolas. Na saúde, a CGU identificou desvio de mais de R$ 66 mil. 

O ex-prefeito João Batista Dias, que governou por dois mandatos é investigado pelo MPF, foi apontado pela CGU como responsável por fraudar licitações e concurso público para favorecimento pessoal. Ao ser derrotado nas eleições passadas, o ex-prefeito deixou o município com uma dívida superior a R$1,5 milhão. “Quando assumimos em janeiro, não tinha nenhum centavo em caixa, havia uma dívida milionária e problemas para celebrar convênios”, disse a prefeita Neuma Rolim.

O ex-gestor ainda deixou servidores sem receber o salário de dezembro de 2012 e o 13º. “Foi um prejuízo grande na minha vida. A pessoa passa o ano trabalhando honestamente pra receber um salário mínimo e quando chega o fim do ano nem recebe salário e nem o décimo. Tive que fazer empréstimos para pagar as contas e comprar comida para meus filhos, porque o prefeito desviou o pagamento para a conta dele na época”, lamentou a auxiliar de serviços gerais, Maria do Livramento Silva, 51.

O vigilante João Carlos de Oliveira, disse que além de não receber salário foi surpreendido com o contracheque debitado, como se tivesse recebido os vencimentos. “O próprio prefeito foi ao banco e transferiu os recursos da saúde para conta e depois sacou tudo e não se sabe para onde mandou o dinheiro. Foi constrangedor ver meus filhos passando necessidade”, desabafou.

Sem esgotamento sanitário, os moradores convivem com esgoto a céu aberto. Na maioria dos bairros, não há pavimentação. embora o ex-gestor tenha feito uma nota de empenho alegando investimentos de mais de R$ 100 mil para calçamento das avenidas.

Em apenas nove meses, o Ministério Público Federal na Paraíba (MPF-PB) ajuizou 71 ações de improbidade administrativa. Desse total, 90% foram contra ex-prefeitos e prefeitos que foram reeleitos nas eleições de 2012. Segundo o MPF, a maioria dos processos ajuizados versa sobre crimes de enriquecimento ilícito, irregularidades em processos licitatórios e na execução de convênios. Em 2012, foram ajuizadas 76 ações. Segundo dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), o Tribunal de Justiça do Estado (TJPB) julgou, até novembro deste ano, 402 processos de improbidade e crimes contra administração, relativos aos anos de 2012 e 2013. 

Mutirão pega corruptos

Somente no “Mutirão da Meta 18”, que envolve o julgamento de processos de Improbidade Administrativa e Crimes Contra a Administração Pública, foram prolatadas 362 sentenças, durante os 90 dias de esforço concentrado. A maioria (70%) condenou ex-gestores. No ano passado, foram prolatadas apenas 71 sentenças. 

Eles foram condenados e além de serem enquadrados na Lei da Ficha Limpa, ainda poderão ser presos, em caso de condenação por peculato e lavagem de dinheiro. “Existem dois tipos de ações. Uma sobre crimes contra a administração, como peculato, que pode ter como punição a detenção, cassação dos direitos políticos e impedimento de celebrar qualquer tipo de convênio com a união. Já na ação de improbidade, a punição  também a cassação dos direitos políticos, impedimento de fazer contratos com a união e ressarcimento dos recursos desviados. Eles foram condenados pelos juízes 

Para o juiz Aluízio Bezerra, que coordenou a ação, o resultado foi positivo e pegou os ex-gestores de surpresa.  “È um avanço extraordinário que demonstra o esforço do Poder Judiciário paraibano em dar respostas à sociedade, às condutas reprováveis de agentes públicos que cometeram mal feitos com recursos financeiros do poder público, e, desta forma, combatendo os atos de desonestidade, de enriquecimento ilícito e de desvio de verbas públicas. A partir do momento que se desvia recursos da Saúde, se está atingindo um universo de pessoas como crianças e idosos, da mesma forma, na área da Educação, vindo a atingir crianças e adolescentes, juventude que precisa de um melhor preparo e qualificação”, destacou o desembargador.

O juiz ainda destacou que no próximo ano, a ‘Meta 18’ vai analisar mais 300 processos e também novas ações que surgirem contra gestores  que estão em atividade. “É preciso que haja uma resposta pronta, no sentido de afastar essas pessoas da vida pública, visando assim preservar o ambiente para que, aqueles que têm interesse, boa vontade e comprometimento com a coisa pública, possam exercer suas atividades em beneficio da sociedade”, frisou.

Rombo é maior na infraestrutura

De 2010 a novembro de 2013, o Tribunal de Contas da União (TCU), imputou condenações que chegaram a um montante de  R$ 146,5 milhões.

A maioria dos processos em que o TCU imputou débito se refere a convênios firmados com prefeituras. As verbas destinadas à infraestrutura urbana são as que mais são desviadas, seguidas das que são  repassadas para a educação e para a saúde, cuja aplicação correta poderia melhorar, o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) desses municípios. Em 2012, foram imputados R$ 14 milhões e este ano, o montante já é superior com R$ 18,1 milhões.

20% da verba da saúde desviada

Somente em 2010, foi desviado na Paraíba, um montante de 20,84% do total de recursos federais destinados aos programas do Ministério da Saúde. O dado é da Controladoria Geral da União (CGU), que fiscalizou cinco municípios paraibanos através do 32º e 33º sorteio, ocorridos em maio e julho daquele ano  e que serviram de amostragem para todo o Estado.

O valor auditado pela CGU nas cinco cidades foi R$ 14,5 milhões, dos quais o órgão detectou que foram desviados R$ 2,6 milhões. As principais irregularidades que justificam a constatação da CGU são fraudes em processos licitatórios, compra de materiais com preços superiores aos de mercado, alteração de pactuação de metas originando jogo de planilhas, aquisição de materiais sem procedimento licitatório, desvio de finalidades no pagamento feito com recursos federais.

Os municípios que servirão de base para fiscalização da aplicação dos recursos federais foram São Sebastião de Lagoa de Roça no Brejo, Araruna no Curimataú, Tavares, Imaculada e Riacho dos Cavalos, no Sertão. Em todos esses municípios, o órgão detectou as irregularidades no trato com o dinheiro público destinado aos programas do Ministério da Saúde.

Depois da saúde, a área que a CGU detectou mais irregularidades foi na educação. Entre os anos de 2009 e 2010, a Controladoria fiscalizou desvios de repasses que serviram como amostragem para projeção de todo o Estado. A CGU detectou que em 2009, a Paraíba recebeu mais de R$ 731 milhões para o Fundo de Desenvolvimento e Manutenção da Educação Básica (Fundeb) e deste total, R$ 51,9 milhões foram desviados, representando 7,1% de todos os recursos repassados. Somente nos municípios fiscalizados, o montante desviado dos programas educacionais chega a R$ 2,2 milhões. Na prática, as irregularidades repercutem direto no cotidiano da população.

Correio da Paraíba