
OS CAMINHOS DAS PESQUISAS levaram-me a uma pessoa, um padre, que vinha pesquisando sobre os grupos originários da atual região dos Cariris Velhos da Parahyba – nosso Mundo-Sertão, e me deparei com um sacerdote muito interessante, um pesquisador. Pessoa alta, um pouco arqueada nos ombros, magro, de olhar terno e fitava o horizonte, mas não divagando, buscava enfrentar os inúmeros desafios que a vida o impunha. No fim da noite, depois da missa, lá em Santo André (de Gurjão!), fomos ao seu encontro, tentamos um contato.
Gentil, iniciamos uma conversa mui honesta, dividindo uma série de conhecimentos sobre o Cariri e os indígenas que habitaram nossas terras antes do “descobrimento”. Na praça de Santo André, víamos os populares a passear, conversávamos como se fossemos amigos de longas datas, e, assim, eu o observava. O sotaque denunciava um lugar distante, mas ele tentava disfarçar, isso para que sempre pudesse estar próximo daquelas pessoas que ele vivia, com quem ele convivia.

De Jan Joris transformou no conhecido João Jorge, um homem que a partir dali já detinha toda a minha admiração. Se poderia se superar por uma exótica nobreza de nome diferente, buscou assemelhar-se ao povo, estar mais perto dele, assim adotou a correspondência de Jan Joris para João Jorge e como não admirar esse ato? Por muitos dias fiquei a pensar. Meu amigo Agenor me disse: “Thomas, faz muitos anos que nossa igreja de São José (em Juazeirinho) encheu. Com o pe. João, aconteceu”.

João Jorge veio de Geldrop, na Holanda, e chegou a uma das regiões mais desafiadoras do país, os Cariris Velhos da Parahyba, isso em meados da década de 1980 e de uma coisa ele lembra: um agricultor, em estado de miséria, em seu ranchinho, devotava um terço do pe. Cícero. Questionado pela fé, ele disse que tinha ido a pé ao Juazeiro e, recebido pelo “Padim Ciço”, falou com ele no dia em que chegou e antes da volta, 15 dias após. Isso o impressionou! Nesse momento, ele esteve à frente de uma das paróquias mais importantes de nosso estado, a de Monteiro, abarcando os seus arredores. Foi assim que buscou escrever uma história das paróquias em que estava atuando, não simplesmente por publicar um livro, mas pelo ideal de que: “A gente não ama o que não conhece” e ter o conhecimento da paróquia e de toda a região, é algo extremamente forte no sentido social de não só ter e manter os homens na terra, como garantir que aquele caminho é o religiosamente correto. Ao longo dos anos, soubemos de que o pe. João arregimentou recursos para benfeitorias inúmeras em diversos sítios, dinheiro estrangeiro aqui empregado, mas que ele jamais tomou para si.

Buscando escrever sobre a história das paróquias em que atuava, começou a receber tantas das histórias, de “pedras de corisco” a participação de cangaceiros. Informações inúmeras sobre inscrições rupestres e a primeira vez em que visitou, ficou maravilhado. Em dado momento, ele entendeu que aquelas terras já eram ocupadas de maneira ancestral. Estudioso e um pesquisador nato, pe. João mostrou-me passagens de Lèvi Strauss e outros pesquisadores e, em sua sala-biblioteca, mostrava-me, inclusive uma espécie de fuso de pedra que parecia o que era utilizado pelos artesãos caririzeiros em sua labuta no tear.
Mês passado, mandei uma mensagem ao querido padre e ele respondeu sobre a dificuldade em que foi vítima depois de duas cirurgias. Dias depois, o visitei junto ao amigo Julierme do Nascimento. Juvandi Santos e Daniel Duarte não puderam ir por estarem em outros compromissos, mas quiseram. Fizeram votos e rezaram em intenção ao nosso querido padre que passava por essa adversidade.
Imagens da visita ao Pe. João Jorge Rietveld em 06 de julho de 2025 – TB

Ele estava bem, mas tão bem que já me questionava sobre Galante. É que ele é pároco de lá e, não podendo ver como foi o cotidiano no São João, questionou-me e pediu material sobre aquele distrito de Campina. Em Cabaceiras, sua última paróquia, surtiu vários livros e é de uma alegria imensa vê-lo no Seminário São João Maria Vianney em um aposento em que ele possa pensar, raciocinar, refletir…
De uma decência e alegria contagiante, ao se despedir, agradeceu-me pela homenagem que fiz a Niède Guidon, parecia que era para ele. Pe. João, um homem de Deus.
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