Adega
“Roube no varejo, mas sempre distribua no atacado. Eis o segredo do prestígio político.”
— Provérbio não registrado no manual de ética, mas citado em voz baixa por muitos.
Roube no varejo, mas sempre distribua no atacado.
A chance de muitos roubados recuperarem tende a zero, se a distribuição for bem feita no atacado.
Um senhor, pedagogicamente (caminhando à minha frente), dizia isso a outro. E continuou:
— Qualquer dúvida, leia o manual Sonho Grande, de Jorge Paulo Lemann, Marcel Telles e Beto Sicupira.
O outro, já mostrando interesse, comentou:
— Você viu a adega do careca do INSS? Pois é! Ele tinha como distribuir dinheiro empacotado em caixas de vinho. Era como o famoso Vinho do Padre, da Paraíba. Ambos roubaram no varejo, mas sempre distribuíram no atacado — em grosso.
— Imagine só: o padre roubou um hospital que assistia a pessoas paupérrimas (que são muitas), assim como o careca, que roubou aposentados desprotegidos (que são tantos, como os nossos pais e, por sorte, avós). Não tem como esses pobres se defenderem. Já há até uma desculpa de “risco sistêmico” ao setor bancário, por conta dos empréstimos consignados.
— E veja: tem associações e sindicatos. Se essas entidades não existissem, o mundo tampouco existiria. Deus fez tudo — com associações e sindicatos, mesmo tendo deixado a chuva para taumaturgos.
Eles já estavam bem longe de mim quando foram assaltados. Então, o primeiro, o do Manual de Lemann, disse:
— Eu nem ligo. Eis a diferença. Esse me levou apenas o dinheiro da água de coco. Será preso daqui a pouco.
É uma questão de tempo — ou melhor, de tecnologia oficial.