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JK e O HOTEL TAMBAÚ (RAMALHO LEITE)

Juscelino sendo recebido no Hotel Tambaú pelo Gerente Sr Sales, o chefe da recepção Sr Lucas e o recepcionista Pedro Marinho

Era março de 1972 e Juscelino Kubitschek, ex-presidente cassado pelo regime militar, cujo primeiro presidente ajudara a eleger com o seu voto e seu apoio, chegou à Paraíba disposto a aproveitar o carnaval do Clube Cabo Branco, atendendo a convite da sua diretoria. Adolfo Bloch, dono da Revista Manchete, o banqueiro Walter Moreira Sales, o cantor e compositor Dilermando Reis e Fernando Cunha Lima, organizador do tour, formavam com dona Sara, a comitiva do líder mineiro que o Brasil adotou. Juscelino foi recebido discretamente no Hotel Tambaú e nenhum jornal local noticiou sua presença. E nem precisava. Os órgãos de segurança chegaram antes.
Sabe-se hoje, graças ao trabalho da Comissão da Verdade, que os agentes do SNI alugaram dois apartamento ao lado dos que estaria hospedada a vigiada comitiva. Antes que aportassem os hóspedes ilustres, colocaram microfones em vários ambientes, para a escuta clandestina. A partir de então, cada passo de JK esteve sob as vistas constantes dos agentes, que registraram conversas e encontros e. também, os nomes dos paraibanos que chegavam para abraçar o ex-presidente, ciceroneado desde seu desembarque pelo consul Raimundo Onofre, que nunca foi diplomada mas ganhou esse apelido pela “representação” que fazia do senador Rui Carneiro. Outro Raimundo, o Lira, foi objeto das informações sigilosas: então vendedor de carros em Campina Grande, mandara um especial para servir aos deslocamentos de JK .
A presença de JK entre salgadinhos e whisky na casa de admiradores foi tolerada, sem atropelos. Aceitá-lo, porém, diante da multidão que frequentava o carnaval do Cabo Branco, era outra história. Partiu da maior autoridade militar local a ordem para desconvidar o presidente. E a diretoria do Cabo Branco rendeu-se, mesmo com a interferência de autoridades mais condescendentes, a exemplo do médico Manoel Gaudêncio, chefe da Casa Civil do governador Ernani Satyro. O gerente do Hotel Tambaú, chocado com a desfeita aos seus hospedes, resolveu improvisar um carnaval para JK , na boate do hotel, ainda não concluída. Uma troça de bairro, com seus integrantes cheios da cachaça da tarde, abrilhantaram a noite carnavalesca do construtor de Brasília.
Não se registra qualquer pronunciamento ou reclamação de JK, com relação ao episódio que desmerecem os valores paraibanos de hospitalidade. O presidente cuidou de desfrutar as delícias do hotel, que não conhecia e, fez chegar ao seu projetista, o arquiteto Sergio Bernardes, a alegria de compartilhar aquela obra que considerou “a mais aprazível não apenas do Brasil, mas do próprio mundo”.
E acrescenta: “Já andei muito, conheço demais as rotas de turismo internacional e nunca me abriguei num hotel que cativasse tanto pelo sóbrio, elegante e simpático arranjo de todas as suas peças. Os meus parabéns são realmente calorosos, porque você pode estar certo de que, em assuntos de hotéis de turismo, ninguém produziu um melhor do que o seu”.
E conclui JK, dirigindo-se a Sergio Bernardes: “com meu abraço muito afetuoso, os votos para que você prodigalize seu gênio, através deste pais, e produza outras obras tão interessantes como a que assinalou o êxito de Tambaú. Abraço afetuoso de Juscelino Kubitschek”.
A carta de JK para Sergio Bernardes, que me chegou às mãos através desse grande pesquisador que se chama Osvaldo Trigueiro do Vale, revela a alma imortal de JK. Humilhado na Paraíba relegou a desfeita e preferiu proclamar ao mundo, as excelências dessa obra de arte que nasceu da cabeça de João Agripino e do compasso de Sergio Bernardes. Uma obra que mudou a história da Paraíba.( Republicado para dar vergonha a quem mantém o Hotel Tambaú nas condições atuais.)

1 comentário em “JK e O HOTEL TAMBAÚ (RAMALHO LEITE)”

  1. Caro Ramalho Leite, o amigo tem razão, lamentável que um equipamento como o Hotel Tambau, referência nossa no mundo inteiro, tenha chegado a esse ponto de completo abandono.
    Eu com o amigo nosso em comun, Vava da Luz, trabalhamos na recepção do Hotel Tambau desde a inauguração e tivemos o privilégio de vivenciar esse triste episódio ocorrido com o grande Juscelino e sua comitiva, Adolfo Bloch, Walter Moreira Sales, Fernando Cunha Lima, Dilermando Reis e outras personalidades.

    No dia do triste episódio, em que o ex-presidente foi impedido de participar do Carnaval do Cabo Branco, fui encarregado pelo gerente do hotel, o Senhor José Sales, para arrumar um conjunto musical, pois iria tentar fazer alguma brincadeira no espaço que seria destinado ao que seria posteriormente a Boate Tropical.
    Já à noite, fui atrás no Bairro do Roger dos colegas da Troça denominada: ‘Os troços na Troça’ da qual eu era um dos componentes e evidente já encontrei a rapaziada pra lá de Bagda, em razão da bebedeira o dia inteiro e até pensei em desistir, mas não poderia falhar na importante missão e levei todos numa Kombi até o hotel, onde aos trancos e barrancos eu e rapaziada demos o recado, sendo bastante aplaudidos por Juscelino e seus importantes convidados estando todos exceto eu, bem alterados, o que facilmente todos perceberam.
    Neste dia outro fato interessante aconteceu, era preciso oferecer a Juscelino e comitiva um uísque de qualidade e o hotel não tinha no estoque, sendo então à tarde, Vava da Luz, juntamente com o comprador Marcos, convocados para se dirigirem na velha camioneta Veraneio, ao Recife e voltar a tempo para que tais bebidas fossem oferecidas aos importantes visitantes.
    Mesmo com a grave desfeita que sofreu em nossa Paraiba, ficou a certeza para nós, que pelo menos com o Hotel Tambau e seus empregados Juscelino ficou bem satisfeito, considerando a gorda gorjeta deixada em seu nome, pelo banqueiro Walter Moreira Sales, para divisão com todos nós, que jamais tinhamos conhecido clientes tão generosos.
    Em tempo: o jovemna recepção boquiaberto com a presença de Juscelino sou eu.

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