NO INSTANTE em que o sol começava seu recolhimento diurno o meu amigo da Paróquia Santo Antônio do Menino Deus chegava à Igreja Nossa Senhora de Lourdes. Escolheu um local estratégico e prostrou-se aguardando a realização da Santa Missa que iniciaria apenas as 20 h, celebrada em ação de graças homenageando a Romaria da Penha.
Em nenhum momento se cansava. Entre uma garrafa de água e outra se hidratava preparando-se para a caminhada de quatorze quilômetros da Igreja Nossa Senhora de Lourdes até o Santuário de Nossa Senhora da Penha, no bairro do mesmo nome.
Quando começou o trajeto se manteve próximo à Santa, local privilegiado que só foi possível assegurar devido a sua persistência e determinação em chegar ao local com cinco horas de antecedência do início da caminhada.
Seguia a passos lentos, mas firmes. O olhar fixo na imagem o fazia ter a sensação de estar sendo retribuído com uma expressão de pureza e santidade. Observava os inúmeros romeiros ao seu lado. Pessoas de todas as idades, crianças, adolescentes, homens, mulheres, idosos, portadores com deficiência, pretos, brancos, que, animados por vários trios elétricos, seguiam cantando louvores a Deus, rezando e entoando suas jaculatórias, fazendo suas preces e agradecimentos pelas graças alcançadas. As manifestações de fé eram as mais diversas: fiéis carregando objetos, muitos descalços, mulheres grávidas, famílias carregando réplicas de casas, pessoas com cópias de exames médicos, muletas, carteiras de trabalho, entre outras simbologias.
Vez ou outra o meu amigo se interrogava: o que levava mais de meio milhão de pessoas em um sábado à noite deixar o conforto e a segurança dos seus lares para caminhar por mais de cinco horas ao lado de uma Imagem? A resposta estava nele próprio – na fé que carrega dentro de si. Rememorou que a própria história da origem da Capela revela o quanto a fé é capaz de operar milagres, pois sim, foi no ano de 1763, quando a tripulação de uma embarcação portuguesa saiu em direção à Portugal, mas ainda no litoral paraibano enfrentou uma grande tormenta e, aflita, pediu proteção a Nossa Senhora da Penha, prometendo erguer uma ermida em sua honra no local em que aportasse em segurança. Horas depois, todos conseguiram desembarcar com tranquilidade na então Praia de Aratú – hoje Praia da Penha. Como prometido, a construção foi feita.
Com o passar dos anos tornou-se uma festividade católica dedicada a Nossa Senhora da Penha, que ocorre anualmente na cidade de João Pessoa no último final de semana de novembro. Celebrada continuamente desde o ano de 1763, a romaria se desenvolve ao redor da imagem centenária de Nossa Senhora da Penha, trazida de Portugal pelo marinheiro Pedro Siqueira em agradecimento pela graça alcançada. A pequena estatueta, popularmente conhecida por “santinha”, é objeto de importante devoção durante todo o ano, sendo custodiada na histórica capela homônima, nas proximidades da Praia da Penha e transportada pelos peregrinos durante a Romaria, procissão que tornou-se Patrimônio Histórico, Cultural e Imaterial da Paraíba, graças à lei nº 11.417/2019, de iniciativa da atuante deputada estadual CIDA RAMOS.
Às 3:30 da manhã o meu amigo chegou ao Santuário, porém ainda não voltaria para casa. A Missa Campal presidida por Dom Frei Manoel Delson Pedreira da Cruz, Arcebispo Metropolitano da Arquidiocese da Paraíba o manteria acordado até as seis horas da manhã, quando então, cansado, mas regozijado, deitou-se na cama, agradeceu a Deus por mais aquela experiência devocional e dormiu, mas não sem antes me ligar e me dizer que havia rezado bastante por mim e que espera no próximo ano tê-lo ao seu lado na Romaria.
Muito bom texto, Gilberto.
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