Essa música é primorosa, tanto a melodia, quanto a letra. São seus autores, em parceria, Samuel Rosa, Lô Borges e Nando Reis. Fez grande sucesso quando lançada em 2003 pela banda mineira Skank. As dualidades estão presentes no seu conteúdo, citações que nos levam a delirar, fantasiar, dar asas à imaginação no sentido dos desejos.
“O céu está no chão/O céu não cai do alto/É o claro, é a escuridão”. Quando imaginamos um lugar bom, que nos deixa em paz, vivendo um intenso momento de felicidade, costumamos dizer que “estamos no céu”. Não o lugar que nos espera em outro plano, após a morte, mas aqui mesmo, na vida terrena. Por isso o “eu lírico” diz que o “céu está no chão”, porque é a ocasião em que experimentamos essa sensação plena de satisfação. Mas ele adianta que “o céu não cai do alto”, essa condição de contentamento, de prazer, tem que ser construída. Necessário se faz saber distinguir os momentos de claridade, onde tudo é mais fácil de ser conquistado, e de escuridão, onde as dificuldades e os percalços muitas vezes nos impõem esforços maiores e paciência para vencer os obstáculos.
“O céu que toca o chão/E o céu que vai no alto/Dois lados deram as mãos”. A realidade e o sonho podem andar de “mãos dadas”. Um não pode seguir em frente sem o outro. Tudo o que se pretende fazer antes precisa ser pensado, sonhado, aspirado.
“Como eu fiz também/Só pra poder conhecer/O que a voz da vida vem dizer”. O “eu lírico” relata sua experiência ao buscar entender o que “a voz da vida” nos tem a dizer. Somos nós mesmos os construtores de nossa história, portanto o importante é saber identificar as oportunidades que nos são oferecidas.
“Que os braços sentem/E os olhos vêem/Que os lábios sejam/ Dois rios inteiros/Sem direção”. Nessa estrofe começa a colocar o projeto de vida como sendo a elaboração de uma história de amor. A unificação de sentidos e sentimentos simbolizada nas ações que os braços possam desenvolver, na visão das coisas que os olhos possam proporcionar, e nas manifestações do que pensam e desejam mutuamente quando os lábios expressam no falar e na troca de carinhos ao se beijarem. Os “dois rios inteiros” significam dois corpos inteiros que se encontram em entrega total, mesmo sem saber ainda a direção que devam tomar.
“O sol é o pé e a mão/O sol é a mãe e o pai/Dissolve a escuridão”. Vejo nesses versos o “sol” representando o amor. Ele é ao mesmo tempo o “pé”, quando nos permite dar rumo aos acontecimentos, e a “mão” quando nos faz produzir, moldar, adaptar as circunstâncias ao que os sonhos nos impulsionam buscar. É “a mãe e o pai”, como um sentimento que protege e orienta na definição de um destino comum, inclusive fazendo desaparecer diferenças, incompatibilidades, que possam impedir o caminhar juntos, “dissolver a escuridão”.
“O sol se põe se vai/E após se pôr/O sol renasce no Japão”. O amor não morre, ele pode desaparecer por momentos, num espaço temporal, mas ressurgirá depois, independente do calendário e do local onde deva novamente aparecer.
“E o meu lugar é esse/Ao lado seu, no corpo inteiro/Dou o meu lugar, pois o seu lugar/É o meu amor primeiro/O dia e a noite as quatro estações”. O “eu lírico” conclui que a decisão está tomada, quer estabelecer esse enlace, esse envolvimento, esse compartilhamento de vidas, porque ao lado da pessoa amada é o “seu lugar”, de forma integral, inteira. Ela é prioridade absoluta em tudo, e quer que isso seja eterno, a qualquer hora, “dia e noite”, em qualquer tempo, nas “quatro estações”..
Rui Leitão)