A escola é um espaço ocupado por quase todos os indivíduos durante uma longa parte de suas vidas. Ao nascer, inicia seu processo de socialização familiar, aprendendo a linguagem, hábitos culturais e gostos variados, marcando, nessa fase, uma formação estritamente relacionada ao ambiente do qual faz parte. Depois desse aprendizado na primeira infância, próprio do ambiente familiar, o indivíduo passa para a socialização secundária, momento em que a criança aprende alguns códigos sobre a sociedade, incluindo regras de conduta e outras normas. A escola é uma instituição que marca esse processo de aprendizado. As famílias, em geral, levam seus filhos para a escola acreditando que é o lugar “ideal” para a formação da identidade e, em parte, da personalidade da criança. O ambiente escolar sempre foi e ainda é objeto de estudo para diversas áreas. Desde a filosofia e pedagogia até as ciências humanas de modo geral, há uma preocupação em refletir sobre tal espaço.
No filme O Primeiro da Classe, dirigido por Peter Werner e lançado em 7 de dezembro de 2008, é retratada a história de um jovem chamado Bred Cohen (interpretado por James Wolk), que possui a Síndrome de Tourette. A narrativa abrange momentos desde a infância até a vida adulta, destacando inúmeros conflitos vivenciados pelo jovem devido à doença. O cenário escolar é o principal ambiente onde o personagem sofre bullying, sendo alvo de risadas e exclusão por parte dos colegas e professores. Em alguns momentos da trama, fica evidente a dificuldade da escola em lidar com as diferenças.
A Síndrome de Tourette é um distúrbio do sistema nervoso que envolve movimentos repetitivos ou sons indesejados; quem a possui faz esses movimentos de forma involuntária, por vezes produzindo barulhos incontroláveis. É um filme para se emocionar do início ao fim. Ter uma doença como a Síndrome de Tourette, ser negro, ter baixa estatura, sobrepeso, ser autista ou ter qualquer outra característica que foge dos “padrões sociais” ainda parece ser um problema para a escola oficial e atual. Um espaço que deveria promover uma educação democrática e para a diversidade humana acaba sendo um lugar de reprodução das desigualdades, de exclusão e de violência.
Recentemente, a Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), junto com a Fiocruz, apontou um estudo, realizado entre os anos de 2011 e 2022, que demonstra o aumento da taxa de suicídio entre jovens de 10 a 24 anos no Brasil. No dia 12 de agosto de 2024, fomos surpreendidos com a notícia do suicídio de um jovem de 14 anos, que, segundo os familiares, sofria bullying na escola. O bullying, como uma atitude agressiva e violenta, parece ter na escola um local propício e “natural” para a proliferação dessas atitudes. O jovem era bolsista e estava no 9º ano do Ensino Fundamental II, o que parecia ser um sonho para a família, mas se transformou em um pesadelo. A criança relatava sofrer bullying por ser negro, de periferia e gay. O mais preocupante é que as notícias posteriores emitidas pela escola sugerem que é preciso “repensar a concessão de bolsas para alunos de baixa renda”. Não parece haver uma preocupação com as motivações do suicídio do adolescente, o que demonstra a total despreparação da escola e a irrelevância dada a um tema extremamente preocupante. Seja aluno da escola pública ou privada, o racismo, a homofobia e os preconceitos religiosos devem ser combatidos de forma rigorosa, e a escola, junto à família, tem um papel preponderante nesse processo.
A história narrada da vida de Bred Cohen nos emociona por sua perseverança, luta e resistência contra o bullying e as crueldades vividas por ele no âmbito escolar. No entanto, um final feliz nem sempre ocorre. No caso desse jovem de São Paulo e de outros tantos espalhados pelo mundo e no Brasil, muitos não resistem e acabam tirando suas próprias vidas. O que parece banal não pode ser naturalizado dessa maneira. Precisamos combater incisivamente essas ações que, na escola, têm uma proliferação legitimada, simbólica e sutil, rearranjando uma sociedade excludente, preconceituosa, autoritária e violenta.
Aproveitando o mês de setembro para propor este debate, que representa o chamado “Setembro Amarelo” — criado em referência ao jovem Mike Emme, que cometeu suicídio em 1994 aos 17 anos. Mike restaurou um automóvel Mustang 68, pintando-o de amarelo que ficou conhecido como “Mustang Mike”. No funeral, seus amigos montaram uma cesta de cartões e fitas amarelas com a mensagem: “Se precisar, peça ajuda”. A ação ganhou uma proporção mundial e, em 2003, a Organização Mundial da Saúde (OMS) instituiu o dia 10 de setembro como o Dia Mundial da Prevenção ao Suicídio. O amarelo do Mustang de Mike foi a cor escolhida para representar essa campanha. O amarelo, como uma cor que combina com a luz — a luz no fim do túnel ou, na representação de uma flor, o girassol que segue a luz do sol — representa a alegria e a vitalidade.
Ainda lembramos a música do Emicida, “AmarElo”, como uma mensagem de amor e fé para o enfrentamento da dor, da depressão e da luta por um mundo melhor. Em seus versos, ele também usa paráfrases de Belchior na sua música “Sujeito de Sorte”, repetindo: “Tenho sangrado demais, tenho chorado pra cachorro. Ano passado eu morri, mas esse ano eu não morro.”
Por fim, é preciso pensar em todas essas questões que envolvem a sociedade e a escola na tentativa de propor um ambiente mais democrático, diversificado e, acima de tudo, saudável e feliz.
*Doutora em ciências sociais pela Universidade Federal de Campina Grande (UFCG) e professora de sociologia no departamento de ciências sociais da Universidade Estadual da Paraíba (UEPB)
Redação Paraíba Já/VAVADALUZ