Li, em Wesley C. Salmon, do Curso Moderno de Filosofia, na Universidade Brown, que, na Antiga China, considerava-se que o eclipse era causado por um dragão, desejoso de devorar a Lua. E os inventores da pólvora e dos fogos de artifício divulgaram que o tal dragão, lançador de chamas pela enorme boca, só temeria quem tivesse fogo como ele. Assim, os chineses compravam fogos de artifício para afugentar o monstruoso animal ameaçador. Como tantas outras inúmeras superstições, essas tentativas logravam êxito. Jogavam os fogos e, depois deles, o eclipse passava. Achavam que, desse modo, teriam afugentado o dragão. Obviamente, não existia esse temeroso animal; nem o seu desproporcional desejo de devorar a Lua, tampouco, relação causal entre os fogos de artifício e o fim do eclipse lunar.
Essa história muito me ajudou, como professor de Lógica, para ensinar aos alunos sobre a falácia causal do post hoc, ergo propter hoc, ou do enganoso e errado princípio do “depois disso, logo por causa disso”. Ora, logicamente, nenhuma relação causal existiria entre os fogos usados e o fim do eclipse lunar. Também, em algum momento, a Lua teria se mexido porque se sentiu ameaçada pelo suposto Dragão, nem o inexistente Dragão fugiu, apavorado pelos fogos de artifício. Crendices falaciosas como essa são praticadas, ainda hoje, no mundo das curas milagrosas, a troco de alguns reais…
Os sábios egípcios de antigamente, senhores de misteriosos conhecimentos, para a famosa mumificação dos faraós e para a construção de elevadas pirâmides, com fácil manejo de pesadíssimas pedras, respeitavam, hierarquicamente, seus sacerdotes, senhores da previsão de eclipses e, sobretudo porque, durante o eclipse solar total, aproveitavam do fenômeno para transformá-lo de natural em sobrenatural, já que atribuíam poderes divinos ao Sol, que estaria irritado pela impiedade pecaminosa dos fiéis. Então, tais sacerdotes egípcios, astuciosamente, reuniam multidões, prostradas no chão e eles em tapetes, para orarem ao Sol, rogando que ele não desaparecesse… Terminado o eclipse, os sacerdotes entravam no interior dos seus palácios, carregando consigo cestas e cestas de moedas de ouro, como dízimo pago pelo povo pela “graça” alcançada. E o povo, aliviado do pavoroso medo, voltava ao servil trabalho da colheita de trigo ou da plantação de papiros, às margens do Nilo. Ou talvez para carregar pesadas lápides para esculpirem obeliscos ou, como se fossem tijolos, para a construção de altíssimas pirâmides, simplesmente para servirem como túmulos dos faraós.
Citações semelhantes se encontram no Antigo Testamento, quando condutores do povo, durante o eclipse, dirigem-se aos astros para que eles não saiam das funções a que foram criados: “Sol, detém-te sobre Gibeão, e tu, ó Lua, sobre o vale de Ajalon. (…) E, de fato, o Sol parou no zênite e não se moveu durante quase um dia inteiro”. Interpreta-se que o eclipse significou que a Lua e o Sol tivessem parado e não tivessem apenas passado um pelo outro.
Quando criança, ouvi contar que tudo isso seria sinais do fim do mundo, tal visão apocalíptica nos fazia medo. E ainda hoje, há quem se atemorize com o eclipse, alegando que evita vê-lo para não cegar… Depois desse de agora, conversei com intelectuais que preferiram dormir, durante a tarde do dia 13 de outubro; e os não intelectuais disseram-me que preferiram preparar sopa, macaxeira e jabá para o jantar. Confesso, não tive medo, mas me protegi da imponência do Sol com a lente de Cabilo, atrás da minha casa, à margem direita do rio Paraíba, levando a isso filhas, netas e netos. Poderia ter perguntado aos meus pais como Pilar se comportou durante o eclipse que aconteceu anos antes de eu nascer. Mas, lamento que todos nós conversamos pouco com nossos pais, sobre essas coisas, o que se torna impossível depois de eles morrerem… Eclipse traduz também desaparecimento, e é assim que tal fenômeno terminou: o eclipse total do tão esperado e mirado eclipse solar anular.