Querem me transformar numa criminosa!”, diz paraibana que foi expulsa da PM/PE por publicar um vídeo
Numa espécie de manifesto solitário, Mirella afirmou que “a corporação é uma instituição doente, com jogo de poderes muito grande, composta de pessoas que se superestimam por terem postos superiores, muitas vezes, diminuindo, perseguindo, fazendo pouco caso, humilhando e coagindo aqueles que estão em posto inferior”
A expulsão da soldado Mirella Virgínia Luiz da Silva foi publicada no Diário Oficial do Estado dia 1º de setembro. A investigação indicou que, no dia 16 de setembro de 2021, ela publicou um vídeo no YouTube com várias referências negativas e críticas à Polícia Militar de Pernambuco.
O caso teve investigação conduzida pela Corregedoria da Secretaria de Defesa Social de Pernambuco. A soldado Mirella Virgínia Luiz da Silva foi autora de protocolos, na mesma Corregedoria, de denúncias contra abuso de poder, assédio moral e sexual e perseguição envolvendo outros policias. De acordo com seu relato, Mirella vinha buscando os meios legais oferecidos pela própria Corporação para averiguar um problema sistêmico presente não apenas na Polícia Militar de Pernambuco. Para Mirella, o vídeo publicado em 2021 foi a gota d’água depois de anos de adoecimento mental.
“Em janeiro de 2018 eu já estava surtando, comecei a tomar remédios, já não era a mesma. Todo mundo lá vivia um pavor”. Mirella acumula, pelo menos, 6 atestados médicos, dois laudos feitos por médicos particulares, uma internação em unidade psiquiátrica, um atendimento no CAPS. Os atestados médicos apontavam insônia, quadro grave depressivo e sintomas graves de idealização suicida.
Segundo publicou o Portal Paraíba Feminina, documentos obtidos demonstram que entre maio de 2018 e novembro de 2021, Mirella foi examinada pela Junta Médica da Polícia Militar em pelo menos, sete ocasiões. O documento de 31 de maio de 2018, atestou a “capacidade da mesma retornar ao expediente administrativo “DESARMADA”, devendo manter acompanhamento com a Psiquiatria e Psicológico”.
Em outra perícia, que data de 1º de fevereiro de 2019, foi emitida Licença para Tratamento de Saúde (LTS = 140 dias), com recomendação médica de não portar arma de fogo. Ainda em 2019, dessa vez no mês de outubro, a terceira perícia foi realizada, com a mesma conclusão: foi emitida Dispensa para Tratamento de Saúde (DTS =160 dias), dispensada de serviços externos e operacionais, podendo exercer atividades laborativas internamente, com recomendação médica de não portar arma de fogo. Outras perícias foram realizadas em março e agosto de 2020, com o mesmo resultado: dispensada de serviços externos e operacionais podendo exercer atividades laborativas internamente, com recomendação de não portar arma de fogo.
Em 13 de setembro de 2021, mais um parecer da Perícia Psiquiátrica da Polícia Militar de Pernambuco atestou que, “a Examinanda apresenta incapacidade laborativa de caráter parcial e temporário (…) recomendamos que a militar exerça atividade-meio e com restrição para o uso de arma de fogo por um período de 30 dias a partir da data deste exame”. Mesmo com o parecer, Mirella foi orientada pelos superiores a retornar ao trabalho de rua. Três dias depois, ela publicou o vídeo que causou sua expulsão.
Ainda em novembro do mesmo ano, um outro Parecer da Perícia Psiquiátrica atestou, após análise de documentos médicos e exame pericial, e do ponto de vista psiquiátrico, a incapacidade laborativa temporária (Licença para Tratamento de Saúde) com restrição para o uso de arma de fogo.
Em abril de 2022, Mirella foi informada de que a Corregedoria da Polícia Militar havia aberto um processo disciplinar. No documento, datado de 5 de abril de 2022, fica claro o motivo do processo: o vídeo publicado no youtube, onde a jovem expõe suas dores e pede ajuda.
Numa espécie de manifesto solitário, Mirella afirmou, entre outros desabafos, que “a corporação é uma instituição doente, com jogo de poderes muito grande, composta de pessoas que se superestimam por terem postos superiores, muitas vezes, diminuindo, perseguindo, fazendo pouco caso, humilhando e coagindo aqueles que estão em posto inferior”.
Segundo a Secretaria de Defesa Social de Pernambuco, a soldado violou dispositivos de regulamentos internos, estatutos militares e leis em vigor no estado. Ainda segundo o parecer técnico do órgão, o vídeo “gerou uma repercussão negativa no seio da tropa da Unidade Militar onde era lotada a imputada”.
Para Mirella Virgínia, que desde 2018 vinha passando por tratamento de saúde mental, ocasionados pelas ações que presenciou e sofreu dentro dos quadros da Polícia Militar, a expulsão da Corporação vai além da mera exoneração.
“Isso vai ficar marcado na minha história como se eu fosse uma criminosa! A Polícia Militar de Pernambuco colocou no mesmos termos, um soldado que atirou contra um adolescente e eu, que fiz um vídeo pedindo ajuda e acolhimento!”, afirma, com a voz embargada.
Na última quarta-feira (6), o GAJOP-Gabinete Assessoria Jurídica Organizações Populares, em Recife, entrou em contato com Mirella e organizaram uma reunião com representantes do Governo do Estado de Pernambuco.
“Essas pessoas me defenderam num nível que nem consigo medir, foram muito incisivas com os representes do governo. Agora é aguardar o andamento das coisas, mas depois de dias horríveis, consigo ver um fio de esperança”, afirmou.
Informações do Portal Paraíba Feminina