Jesus Cristo e o disco voador
Marcos Pires
Nerivan e Zenildo discutiam aos berros no café da manhã da padaria Bonfim. Era tanto barulho que a professora de natação da academia Prodígio (que fica bem longe) interrompeu a aula de hidroginástica e deu uma chegadinha na varanda da padaria para pedir aos dois que baixassem o volume porque os alunos não estavam conseguindo ouvir os apitos da mestra.
O tema da discussão? Nerivan sustentava que os homens são iguais na doença e na morte enquanto Zenildo apontava diferenças entre ricos e pobres, dizendo que os mais ricos, que dispõem de dinheiro para serem internados no Sírio Libanês, podem chegar até mortos no hospital, mas à conta da grana sobrevivem ao menos quinze dias. Naquela altura da discussão um dublê de rico quis dar sua opinião, porém foi cortado pelo Índio do gelo: “- Fica na tua, falso milionário, que teu dinheiro não aguenta o tratamento de um mês de câncer em São Paulo”.
Normalmente quando a situação chega a um nível desses eu interfiro porque nunca gostei de confusões. Ponderei que deveríamos conversar sobre assuntos mais religiosos e propus ingenuamente que eles se preparassem para a volta de Jesus Cristo.
Não poderia dar certo e não deu.
Do nada, um herege disse que se Jesus Cristo voltasse hoje e ao mesmo tempo pousasse aqui na terra um disco voador, o povo teria muito mais facilidade em acreditar no disco voador.
Olha só a provocação.
Num minuto todos falavam aos berros, uns xingando o autor da afirmação, outros apresentando os argumentos mais estapafúrdios possíveis para provar que ele estava errado enquanto um professor universitário tentava dar razão ao provocador, dizendo que já apareceram tantos picaretas querendo iludir a boa vontade dos cristãos que Jesus teria sim muito mais dificuldade de ser acreditado em sua volta do que um disco voador que aterrissasse aqui.
Notei que no meio da discussão um único comensal permanecia calado. Pedi silêncio e perguntei ao empresário o que ele estava pensando: “- Dr. Marcos, se Jesus voltar muitos falsos religiosos vão se dar mal porque terão que devolver a grana que pedem em nome Dele aos incautos e gastam com eles mesmos. De outro lado me interessaria mais o disco voador porque eu colocaria uma oficina para fazer revisões e consertar discos voadores”. Pensei que era gozação, porém ao meu lado Luceninha segredou: “-Esse cara sabe tudo, foi professor de Toin do bitcoin. Bem capaz de pra semana já estar com a oficina montada e ainda conseguir um financiamento oficial ou incentivo da Sudene”.
Todo santo dia tenho que aguentar isso…ô inferno pra ter cão!