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COMO SE FAZIA UM SENADOR

RAMALHO LEITE
Tudo remonta a Roma, inclusive o Senado. O nome vem do latim. Sen,senex,senior que, etimologicamente, significa velho, idoso. Entendia-se, então, que os mais idosos seriam os mais sábios. Aqui se entendeu que eles deveriam ser os “mais sabidos”. Da mesma origem, vem a palavra senilidade. Na sua verve, Dorgival Terceiro Neto costumava dizer que, para ser senador era preciso já ter feito três operações: cataratas, próstata e hemorróidas. Os tempos mudaram e o Senado já aceita até não operados de fimose. Mas, mesmo diminuindo a média etária dos seus membros, a chamada Câmara Alta continua a ser aquele “paraíso” batizado pelo senador Geraldo Melo(RN). Os oligarcas da República Velha mantinham-se sempre no exercício do mandato de senador e, da metrópole, impunham sua vontade aos seguidores que ficavam na província aguardando as ordens. Na antiga Parahyba foi assim até 1915 com o predomínio de Álvaro Machado e desde então, até 1930, com Epitácio Pessoa. Ambos moraram sempre no Rio e, esporadicamente, foram obrigados a visitar seus conterrâneos.
No ano de 1904 governava o nosso Estado o desembargador José Peregrino de Araujo e a eleição do seu sucessor já estava marcada para o dia 22 de junho. O presidente gostaria de eleger seu chefe de policia, Semeão Leal que, todavia, só completaria 30 anos, idade exigida para o cargo, no dia 11 de maio. Reformou-se a Constituição para conceder elegibilidade ao preferido do governo. Peregrino alcançou seu objetivo mas, enfrentou e venceu insistente campanha da imprensa capitaneada pelo valoroso jornalista Artur Achilles no seu “O Commercio”. Semeão tornou-se, de direito, elegível, mas faltava ser acolhido pela vontade do chefe da oligarquia alvarista, o próprio senador Álvaro Machado, que se sentiu desprestigiado com a indicação de um governante à sua revelia. Foi obrigado a visitar a Parahyba para resolver esse imbróglio.
A vontade do chefe era uma vontade de ferro. O comando foi exercido com tanta perfeição que o próprio Álvaro foi escolhido sucessor de Peregrino. Semeão teve que se conformar em ser o primeiro vice-presidente, mesmo sem a confiança do titular. A solução, mesmo satisfatória por restaurar a autoridade do chefe, não era do seu agrado. Para ele, o bom mesmo era viver no Rio e ter uma cadeira no Senado, mandando de lá as suas determinações. E passou a agir com esse objetivo. Sem ferir a Constituição ou a lei eleitoral, foram realizados três pleitos extraordinários assim motivados: quando assumiu o Governo, Álvaro abriu vaga no Senado e para o seu lugar elegeu o seu alter ego monsenhor Walfredo Leal que era deputado federal. Para a cadeira de deputado foi eleito Semeão Leal e, em conseqüência, abriu-se a vaga de vice, na qual foi entronizado o Monsenhor Walfredo. Para a vaga de Walfredo no Senado, foi novamente eleito o próprio Álvaro, que retornava em menos de um ano ao seu mandato senatorial e ao seio da família que nunca desejou morar na Paraíba. Para Osvaldo Trigueiro de Albuquerque Melo,” na Velha Republica esses arranjos eram freqüentes, se bem que não edificantes”.
Na Nova República, nascida após a revolução de 1930, as coisas não mudaram muito. Houve até quem proclamasse que “houve apenas uma troca: os carcomidos velhos, pelos novos”. Os arranjos políticos do tipo acima narrado voltaram a se repetir. O exemplo que escolhi teve como protagonista o jornalista e empresário midiático Assis Chateaubriand. Em 1945 a Paraíba mandou para o Senado Adalberto Ribeiro e Vergniaud Wanderley. Em 1947, a terceira vaga foi preenchida por José Américo de Almeida e, eleitos os suplentes dos três: Carlos Pessoa, Antonio Pereira Diniz e Epitácio Pessoa Cavalcanti, filho do presidente João Pessoa. Chatô, “o Rei do Brasil” como foi consagrado na obra de Fernando Morais, queria ser senador, mas não existia vaga. Sua força era grande perante Getulio Vargas. Conseguiu que o senador Vergniaud Wanderley fosse nomeado ministro do Tribunal de Contas da União. Seu suplente, Pereira Diniz, então deputado federal, preferiu permanecer na Câmara mas foi compensado com um cartório no Rio de Janeiro. Para preencher a cadeira de senador pela Paraíba, foi realizada uma eleição suplementar em 1952. Chateaubriand foi candidato único, tendo Drault Ernani como suplente . Obteve cem por cento dos votos válidos e tornou-se nosso represente no Senado. Na Velha República, como na Nova, era assim que se fazia um senador.