Eu e meu primo Robson quando completei 2 anos
ELE NASCEU ALGUNS MESES depois de mim. Essa quadra cronológica entre 1984 e 85 foi marcante em nossa família. Nasciam ali os primeiros netos de Dona Socorro, nossa vozinha que ainda pequeno a apelidei de “Poté”. Ela, recém-chegada a Campina Grande, vinda de Puxinanã, via seus nove filhos entre a adolescência e juventude, cinco mulheres e quatro homens seguindo o rumo de suas vidas.
Fui o primeiro neto de Dona Poté, ele o segundo, e a partir dali teve início uma relação de sentimento que ia muito mais do que primos, nos sentimos como irmãos. Curiosamente, Papai e sua irmã casaram com duas pessoas de uma mesma família, não irmãos, mas tio, o Renato (que casou com minha tia Margareth) e Mamãe, a sobrinha dele. Assim, criou-se um imbróglio na família. Somos primos legítimos (eu pelo lado paterno e ele pelo lado materno), ele é também primo legítimo de minha mãe. Minha avó materna é tia dele, minha bisavó materna é sua avó paterna e com isso a gente brincava e esses laços entrecruzados só fortaleceram nossa irmandade.
A casa de Dona Poté, nossa avó em comum e de Dona Gertrudes, em Santa Rosa, eram sempre nossos pontos de encontro. Era brincar de bola, pipa ou do que fosse, não lembro de uma briga nossa sequer, realmente não me recordo de alguma desavença. Ao contrário, já nos unimos para brigar com outros primos. Torcemos para o mesmo time graças a Papai que nos levava para o campo do glorioso Treze, estudamos vários anos na mesma escola, sua primeira festa foi comigo e, por isso, gostamos das mesmas bandas. Minha primeira namorada quase foi dele. Bruno e Robson era uma duplinha conhecida, junto a outros amigos e primos, curtimos muito nossa infância e adolescência.
Quis o destino que seus pais se separassem, o que nos tornou não diferentes, mas singulares, fazendo com que as características de cada um completassem o outro. Eu curtia e aproveitava uma liberdade que ele tinha proporcionada sempre pela ausência de um dos pais e ele também curtia o sentido mais rígido de minha casa no que se refere ao horário de dormir, de brincar, de jantar, etc. Sua liberdade o levou aos campos de futebol, a criar passarinhos, tudo aquilo que eu adorava, mas não podia. Me disse um dia desses que queria ter aproveitado a escola como eu fiz e o incentivava.
Ele sempre jogou muita bola, fato é que na adolescência, enfrentou o juvenil do Treze e fez dois gols, sendo chamado para as divisões de base do time de São José. Aquilo abriu a perspectiva para se tornar jogador de futebol. Esse foi um dos motivos que o levou a um grande desafio, ir morar na casa de nossas tias em Recife. Lá tinha um trabalho garantido e também a oportunidade de ingressar em uma escolinha de futebol do ex-jogador Sandro, que foi do Sport e do Botafogo-RJ. Uma das maiores injustiças foi que os deuses do futebol não levaram à frente as oportunidades para ele ser jogador profissional. Em todos os rachas que entra é artilheiro disparado e hoje, por sua farta cabeleira, é chamado de Salah (craque egípcio, sucesso na Europa). Antes dessa viagem, fiz com que ele desse inúmeros autógrafos em uma folha, que guardo até hoje, disse eu: “No dia que você for famoso, vou recortar cada autógrafo e dar para quem quiser”. Rimos bastante em clima de despedida.
Em um jogo recente no Estádio O Amigão em Campina Grande-PB
De volta a Campina, casou com uma amiga de adolescência e teve uma filha linda, minha prima-sobrinha Sofia. Essa etapa de sua vida foi a que ficamos um pouco afastados, ele buscando a manutenção de sua família, eu na faculdade. Porém, os reencontros eram mágicos. Muita conversa, muita história e várias lembranças. O destino o separou de sua esposa e após o início da pandemia, buscou outras possibilidades de trabalho. Muito conversamos e ele sempre ouviu Papai, um porto seguro, até que surgiu uma possibilidade de ir para Portugal, onde um tio nosso está há algum tempo e prometeu não só dar as coordenadas como também o suporte. Desde quando decidiu ir, fizemos algumas coisas como despedida e um momento emocionante foi na véspera. Ele veio aqui em casa, Papai estava isolado em seu quarto, infectado com a covid19 e aos meus cuidados naquele momento, dormia. O acordei. Com a porta aberta conversamos a uma certa distância. Choramos. Abri o portão, ele subiu a rua e aquela cena não me sai do pensamento, como fiquei com o coração apertado!
Nós na Barra do Miriri em Lucena-PB, Set-21
No dia da viagem, enquanto ele partia de Recife, recebi o teste que confirmou a minha contaminação com a covid19. Um dia de muita dor, incerteza e medo. Através da internet acompanhei seu voo e sua chegada. De início, algumas informações e hoje, após um mês em terras lusitanas, consigo enxergar em seus olhos a sua alegria e contentamento nos passos que dia-a-dia tem dado. Nos falamos quase que diariamente. Cada conquista sua, desde um documento tirado a um novo amigo, vai me realizando. Fotos de igrejas e prédios antigos, já me mandou várias. Hoje, em uma cidade cosmopolita no sul de Portugal, tem contato com muita gente de outros países e me testemunha como é viver em um lugar onde se pode andar a pé, passear sem medo de ser assaltado. Já aprendeu uma série de costumes locais, arrisca algumas frases em árabe, toma chá marroquino e após um mês na Europa, tem a certeza do que quer.
Em um retrato que me enviou, vi a alegria sincera naquele sorriso de quem está curtindo a nova vida. Robson, meu irmão, que Deus o abençoe e o sustente em seus objetivos. Forte abraço!
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Publicado na coluna ‘Crônica em destaque’ no Jornal A União de 19 de março de 2022.