O Mundo-Sertão e a saudade
Gosto de perder meu olhar na paisagem do meu Mundo-Sertão. Seus caminhos despossuídos sempre tem algo a nos dizer, a nos revelar. Lembro do amigo Pedro Nunes Filho que em uma de nossas conversas disse: – Menino Bruno, o Mundo-Sertão tem um lado físico e outro figurativo, o primeiro está onde nossa vista alcança, o segundo, dentro de nós, na alma, no coração. Sábias palavras! Que saudade Pedro, que saudade. Se estivesse aqui entre nós, iríamos percorrer os Cariris Velhos novamente, passando de passagem e dialogando sobre a grandeza que essa terra acaatingada possui. Como não estás fisicamente, te levo comigo em meu coração, e sempre em minha mente.
No cair da tarde de sexta-feira passada (30/jan/20), juntei meus “picuai” e rumei para o Cariri. Estava muito cansado, a semana não me poupou, além do mais… como a Rainha da Borborema estava quente, nauseante, Jesus do céu! No dia seguinte, a reunião do Instituto Histórico e Geográfico de Serra Branca – IHGSB seria o maior compromisso, aniversário de cinco anos da instituição e o lançamento de Revista impressa, um marco para o Cariri, estava ansioso por esse momento.
O cansaço, o calor e o desânimo se esvaíram quando vi descortinar diante de mim os contornos serranos dos complexos rochosos do Cariri, tomei a estrada de Catolé de Boa Vista (PB 138), me buli no banco de onde eu dirigia, até achar aquela posição mais confortável, e comecei a observar, os carros iam e voltavam e eu nem aí p’ra eles. A grandiosidade do Mundo-Sertão elimina qualquer ambição, diante daquele cenário carrascal, ninguém ousa se sentir grande. – Grande é Nosso Senhor! Diz sempre Daniel Duarte Pereira; outro devoto dos Cariris Velhos. E as nuvens, cada vez mais densas, roubaram o pano azul do céu. Já em Boa Vista a chuva vem com sua cantinela, tentando talvez se comunicar. Sua presença, já fria, despertava lúgubres arrepios, testemunho insondável dos encantamentos ali existentes, terra poeirenta pisada por curraleiros, cangaceiros, vaqueiros e viajantes, cada um deixando sua marca ferrada no lenho imaginário que ligam todos os viventes.
Pedro, São João do Cariri tá como você deixou, terra avermelhada, sedenta e pedregosa. Parei em minha amiga Terezinha para um café. Sabe Pedro, quando parei, estava escurecendo, não exatamente, pois, não era ainda a hora, mas a barra ficava num tom azul tão forte e espesso que impressionava, é como se começasse a crescer e a imprensar a gente no chão, tomando conta de tudo. Naquele vale do Taperoá senti o vento frio e gélido, e o rio Taperoá com água de barreira-a-barreira dava o aviso que muita água já caiu, e eu nem sabia que muita ainda estava por cair. Em Serra Branca, já a noitinha, me reuni com o Presidente do IHGSB Prof. Zezito e com Sérvio Túlio, tudo pronto para o evento do dia seguinte. Não deu onze da noite e a chuva torrencial tomou conta de todos nós; trovão cantava grosso e os relâmpagos com seus clarões confundiam a noite com o dia, nos recolhemos.
Eita noitada… Pedro, choveu demais. Você precisava ver, em Prata choveu 120mm essa noite, nas hostes da sua antiga Fazenda São Paulo choveu quase 200mm. Viva a Deus… Amanheceu. Fui para o Centro de Convivência receber os convidados, gente de todos os cantos. Pedro, imagino como você iria ficar emocionado com esse evento. Uma verdadeira ode ao Cariri. Tanta gente boa veio para nos prestigiar, Academia de Letras de Campina, Institutos históricos de Esperança, Pocinhos, Areia, do Cariri, até o Paraibano, a nossa casa de memória mais antiga; todos vieram saudar o aniversário de cinco anos, foi maravilhoso! Nele homenageamos o Dr. Brilhante, lembra dele? Outro homenageado foi Severino Moreno, ele é líder no sítio Cantinho, localidade de Serra Branca que foi reconhecida no mês passado como área quilombola, já pensou que maravilha? Nossa terra é preciosamente rica. E sabe quem estava conosco? Seu sobrinho, Pedro Rômulo Nunes, e que por conta das chuvas só conseguiu sair do sítio Carneiro (em Livramento) de moto, me mostrou as botas ainda sujas de barro. No evento lançamos nossa Revista, material didático para alunos e professores com textos para exaltarmos ainda mais nosso Cariri.
Nessas horas, amigo Pedro, você faz ainda mais falta. Você que me ensinou que o Cariri não é só um lugar, é um estado de espírito…